Hoje em dia, quase todo mundo fala em burnout como se fosse apenas “estresse a mais”. Mas hoje quero te convidar a olharmos para esse transtorno através do olhar psicanalítico. Se prestarmos um pouco mais de atenção, percebemos que tem algo muito mais profundo acontecendo aí. Freud, já no começo do século XX, falava sobre como nossa energia psíquica, que ele chamava de libido, precisa circular, se deslocar, investir em objetos, pessoas e ideias. Quando essa energia fica presa, bloqueada ou excessivamente exigida em um único ponto, o aparelho psíquico sofre.

No burnout, não estamos falando apenas do estado físico do sujeito, mas também de um psiquismo que entra em colapso. É como se toda a libido ficasse concentrada no trabalho, sem espaço para mais nada; do ponto de vista freudiano, sem espaço para o desejo, o prazer e a criação. Essa fixação gera empobrecimento afetivo e esvaziamento de sentido. O sujeito continua “funcionando” mecanicamente, mas perde a capacidade de desejar, e para Freud, é justamente o desejo que nos mantém vivos e em movimento.

Por isso, não basta dizer que burnout é só estresse acumulado. O estresse faz parte da vida, mas o burnout revela algo mais: uma falha na possibilidade de simbolizar, de deslocar essa energia para outras áreas, de elaborar o mal-estar. O sujeito, tomado por uma exigência interna (que às vezes se manifesta como um superego muito rígido), deixa de ouvir o próprio desejo, tentando atender a ideais de produtividade que nunca se satisfazem.

No fim das contas, podemos enxergar que burnout é menos sobre “excesso de trabalho” e mais sobre falta de espaço para o desejo, para a fantasia, para aquilo que faz a vida ter graça fora das obrigações. Freud já dizia que saúde mental não é a ausência de sofrimento, mas a capacidade de amar, trabalhar e criar. Se o burnout aparece, talvez seja um sinal de que algo precisa ser resgatado: o direito de desejar, de errar, de não dar conta de tudo — de ser humano.

As férias escolares chegam como um sopro de liberdade para as crianças: sem horários rígidos, sem tarefas escolares, sem aquela correria de todo dia. É um tempo que, do ponto de vista winnicottiano, tem muito valor, já que oferece a chance de brincar livremente, de criar, de se perder no “faz de conta” sem pressa. Winnicott falava muito sobre a importância do brincar como espaço potencial, aquele lugar entre a realidade interna e o mundo externo, onde a criança pode experimentar quem ela é, sem medo de falhar, sem obrigação de corresponder a expectativas (pausa para nostalgia lembrando da infância rs).

Mas, enquanto isso, para muitos pais, as férias são quase o oposto desse descanso: são um convite a lidar com culpa, medo de não estar disponível o bastante, insegurança sobre “entreter” os filhos ou proporcionar atividades “suficientes”. Surge aquela angústia: “Será que estou fazendo o bastante? Será que meu filho vai ficar entediado? E se ele reclamar que está sem nada pra fazer?” É aí que vale a pena lembrar algo que o autor também destacava: o “estar junto” não precisa ser um “fazer o tempo todo”.

Dessa forma, as férias podem ser um convite não só para as crianças descansarem, mas também para os pais olharem para essa relação por um outro ângulo. Não é preciso ser um animador 24hs por dia. Muitas vezes, oferecer um “ambiente suficientemente bom”, que acolha, dê segurança e permita que a criança brinque, invente e até se aborreça, já é mais do que suficiente. Não podemos nos esquecer que é no tédio que nasce a criatividade; é na ausência de agendas prontas que surge a possibilidade de brincar livremente.

Claro que nem sempre é simples. É um desafio encontrar esse equilíbrio entre presença e ausência, entre dar suporte e deixar espaço, até porque para muitos pais as férias são apenas para as crianças e a rotina de trabalho continua, mas talvez possamos fazer com que as férias também possam ser um lembrete de que nossos filhos não precisam de uma programação perfeita, e sim de um ambiente que lhes permita ser quem são. No fim das contas, férias escolares são um tempo em que as crianças não são cobradas de tarefas e rotinas escolares, é sim um descanso para eles e não podemos nos esquecer disso, por isso não precisamos planejá-las com programações diárias. Além disso, se conseguirmos soltar um pouco a ideia de controle e confiar mais no brincar, na espontaneidade e no que emerge desse encontro podemos encontrar um descanso interno em meio a tudo isso.

Boas férias!

Sabe aquela voz interna que não te deixa dizer “não”?
Que faz você topar coisas que não quer, sorrir quando queria chorar ou segurar a raiva pra não parecer “difícil”?

Muita gente acha que isso é só “jeito de ser” ou “educação”, mas a psicanálise ajuda a gente a perceber que existe muito mais por trás.
Na maioria das vezes, esse padrão de agradar não é escolha: é um sintoma. Um pedido do inconsciente para que a gente olhe para a nossa história, os nossos medos e as fantasias que ainda nos prendem.

Desde muito cedo, aprendemos que o amor vem com condição:
• Quando eu sou boazinha, a mamãe sorri.
• Quando eu tiro nota boa, recebo elogio.
• Quando eu ajudo, as pessoas sorriem.

A criança vai entendendo que, pra continuar recebendo amor, precisa corresponder ao que o outro espera. E é aí crescemos com essa lógica dentro da gente: “se eu não agradar, vou ser rejeitada”. É quase como se, sem a aprovação do outro, não existíssemos. E como isso nos afeta? Ficamos com medo do conflito. Abrimos mão de nós mesmos o tempo todo. Nos sentimos esgotados e até ressentidos, porque parece que nunca é suficiente. Nos afastamos do que realmente queremos, porque estamos sempre ocupadas com o desejo do outro. No fundo, vivemos esperando agradar… e nos esquecemos de perguntar: “Mas eu gosto disso? Eu quero mesmo?”

É aqui que a psicanálise pode ajudar, ela não vai dar uma receita do que temos que fazer, mas através da escuta o analista poderá caminhar junto com o paciente para perceberem o que sustenta esse comportamento. De onde veio essa necessidade? Que função ela cumpre na sua vida? O que você teme perder se parar de agradar?

Infelizmente algumas pessoas só conseguem existir através do olhar do outro. E, no processo, vamos entendendo junto com eles que, pra se libertar, é preciso primeiro saber o que está sendo repetido inconscientemente. É um trabalho delicado, mas extremamente libertador.

Mas Andressa é errado querer que o outro me ame ou me veja? Não! Não tem nada de errado nisso, podemos enxergar um problema associado a isso quando vemos nisso uma condição para existir. Então não precisa se culpar por querer ser querido, mas talvez valha a pena se perguntar: “Se eu não agradasse ninguém hoje, eu ainda me sentiria digno de amor?” Se a resposta for “não”, talvez seja hora de olhar para isso com mais carinho.

Sobre esse e outros assuntos você pode encontrar no nosso insta ou no nosso site para se aprofundar.

Quantas vezes você já se pegou pensando: “Mas eu tenho tudo para estar bem… por que não estou?” E aí, junto com essa pergunta, vem a culpa, o medo de parecer ingrato, ou a sensação de que tem algo errado com você. Mas deixa eu te dizer uma coisa: essa sensação é mais comum do que parece e não, não tem nada de errado com você por se sentir assim as vezes.

Vivemos em uma sociedade que nos cobra produtividade, alta performance emocional e gratidão constante. Quando não conseguimos acompanhar esse ritmo, começamos a duvidar de nós mesmos: “Será que estou sendo fraco? Mimado? Ingrato?”

No consultório escuto muitos relatos assim: pessoas que têm um bom emprego, uma família que ama, saúde estável, mas algo nelas simplesmente não encontra paz. E é aí que entra a importância de parar e escutar, de verdade, o que está se passando. Vivemos numa época em que o bem-estar virou quase uma obrigação. Há uma pressão constante para estarmos felizes, produtivos, agradecidos e motivados o tempo todo. E quando algo dentro da gente não acompanha esse ritmo, a frustração aparece. Às vezes silenciosa, às vezes em forma de cansaço, de apatia, de ansiedade ou até em sintomas físicos.

Aqui na psique, nas aulas, nas supervisões e também nos conteúdos que produzimos, tentamos sempre lembrar: nem tudo o que sentimos é visível na superfície. E nem sempre o que está “aparentemente bem” por fora está resolvido por dentro. E é aí que entra a importância de parar e escutar, de verdade, o que está se passando. O sofrimento psíquico não segue lógica matemática. Muitas vezes, o que está em jogo são questões inconscientes, desejos não ditos, conflitos antigos, partes da nossa história que não conseguimos elaborar completamente.

O “tenho tudo para estar bem” parte de um ideal: o de que a felicidade virá quando tudo estiver no lugar. Mas a psicanálise nos convida a questionar esse ideal. Ter as condições externas não garante a satisfação interna. E tudo bem. Isso não faz de você ingrato, fraco ou “menos espiritualizado”. Faz de você um sujeito.

Talvez a resposta não venha de imediato. Talvez não venha em forma de resposta, mas de movimento.

E se você sentir que precisa de ajuda para escutar o que está aí dentro, buscar análise pode ser um bom caminho. A escuta analítica não busca consertar, mas compreender. E isso, por si só, já pode ser profundamente transformador.

Ter uma vida organizada, um bom emprego, relações estáveis ou uma rotina confortável não significa que o sujeito esteja em paz. A falta, o vazio, o desconforto… tudo isso faz parte da experiência humana. E ignorar essas sensações ou tentar apagá-las com positividade forçada pode só aumentar o sofrimento.

Se eu pudesse te convidar a pensar algo hoje, seria isso: em vez de tentar se convencer de que “deveria” estar bem, que tal se perguntar com carinho e curiosidade por que não está?

Mesmo a milhares de quilômetros de distância, há algo no conflito entre Israel e Hamas que nos toca de maneira visceral. Imagens de destruição, crianças chorando, pais desesperados, sirenes, bombas — tudo isso atravessa fronteiras e chega até nós, não apenas como informação, mas como afeto. Não é a primeira vez que isso acontece. Guerras estouram com frequência, mas algumas atravessam a gente de um jeito diferente. E fiquei pensando: por que sentimos tanto, mesmo quando não somos diretamente afetados?

Acredito que há algo de profundamente humano nesse processo. Quando vemos imagens de famílias correndo sob bombardeios, de crianças perdidas, de corpos que já não podem mais contar sua história… não conseguimos simplesmente “não sentir”. Tem algo ali que ressoa em nós. Talvez porque, no fundo, sabemos que poderia ser conosco. Ou com alguém que amamos. E isso basta para o sofrimento se instalar.

A guerra tem esse poder de nos expor ao inominável. Ela revela aquilo que muitas vezes tentamos esconder ou controlar dentro de nós: a violência, o medo, a fragilidade. É como se aquilo que vemos do lado de fora nos mostrasse, de forma crua, o que há também do lado de dentro. Somos confrontados com a nossa própria agressividade, com os nossos impulsos destrutivos, com os nossos limites.

E ao mesmo tempo em que isso nos toca, também nos deixa exaustos. É tanta imagem, tanta notícia, tanto horror, que em algum momento começamos a nos proteger. Nos desligamos, mudamos de canal, evitamos o assunto. Usamos a indiferença como forma de defesa para prosseguir diante de tana injustiça e desumanidade. Essa forma de lidar acaba sendo um jeito do nosso psiquismo dizer “não aguento mais sentir isso tudo”.

Mas ainda assim, algo persiste. Uma inquietação. Uma dor que não é exatamente nossa, mas que também não é totalmente do outro. E talvez seja aí que está o ponto: somos afetados porque somos humanos. E porque, mesmo com todas as nossas defesas, ainda somos capazes de nos identificar com a dor alheia.

Talvez não possamos acabar com uma guerra. Mas podemos pensar sobre ela. Falar sobre ela. Não para nos afogar em tristeza, mas para não anestesiarmos totalmente. Para não normalizarmos o inaceitável 🙏🙏🙏

Amanhã é Dia dos Namorados e talvez esse seja um bom momento para pensarmos juntos sobre o que é, afinal, amar. Não no sentido idealizado que tantas vezes vemos por aí, mas de um jeito mais honesto, mais profundo. Algo que vai além das flores, presentes e jantares à luz de velas. Quero convidar você a refletir comigo sobre uma questão que atravessa não só os relacionamentos amorosos, mas também o modo como nos colocamos no mundo: como encontrar o equilíbrio entre o amor-próprio e o amor ao outro?

Na clínica, e na vida também, escuto com frequência relatos de pessoas que se doam demais nas relações e acabam se perdendo de si. Outras, por medo de se machucar, constroem muros tão altos que o amor sequer encontra espaço para entrar. E muitas vezes, essas formas de amar carregam histórias antigas, feridas que ainda não cicatrizaram, fantasias de abandono ou a esperança inconsciente de, um dia, finalmente ser amado como se precisa.

A verdade é que amar não é simples. Todos nós, em algum nível, já nos perguntamos: “Será que estou cuidando de mim ou estou sendo egoísta?”, “Será que estou me doando ou estou me anulando?”. Encontrar o meio do caminho entre essas duas pontas, o cuidar de si e o se abrir ao outro, é um desafio constante.

O amor-próprio não é sobre se bastar completamente, como muitas vezes se prega por aí. Também não é sobre se colocar acima de todos. É sobre estar em contato com aquilo que se sente, reconhecer as próprias necessidades, saber dizer “não” quando é preciso, sustentar limites. Quando estamos mais inteiros, mais conectados com quem somos, conseguimos estar com o outro de maneira mais leve, sem tanta exigência, sem nos moldar completamente ao desejo alheio.

E amar o outro, por sua vez, não significa se apagar. Significa poder olhar para essa pessoa como alguém separado de nós, com sua história, seus tempos, seus jeitos. É poder estar junto sem tentar controlar, é conseguir escutar sem desaparecer. O amor ao outro não precisa ser à custa de si mesmo.

Talvez o equilíbrio esteja justamente aí: em perceber quando estamos saindo de nós para manter alguém, ou quando estamos tão protegidos que já não deixamos mais ninguém se aproximar. É um movimento sutil, um ajuste fino que acontece o tempo todo. E tudo bem se nem sempre acertamos. O importante é estarmos atentos, abertos a nos escutar e a nos perguntar: como eu tenho me amado? E como eu tenho amado o outro?

Neste Dia dos Namorados, mais do que falar de amor romântico, quero propor esse olhar mais íntimo. Que a data sirva também como convite ao autoconhecimento, à honestidade consigo e à construção de relações mais verdadeiras, com o outro, mas principalmente com você mesmo.

Com carinho,
Psico Andressa.