A idealização do melhor amigo e as frustrações envolvidas.

Dia 30 de julho, comemoramos o Dia Internacional da Amizade. E essa é uma data que sempre me provoca reflexões.

Durante muito tempo, desejei viver relações de amizade semelhantes às que via nas séries de TV, aquelas em que os amigos estão sempre presentes, em qualquer hora do dia ou da noite, prontos para acolher, rir ou enfrentar o mundo juntos. Eu idealizava esse tipo de vínculo e, naturalmente, me frustrava por não conseguir vivê-lo daquela maneira.

Essa idealização, no entanto, diz muito mais sobre nossas fantasias do que sobre a realidade dos vínculos. E Lacan nos ajuda a pensar sobre isso.

Na psicanálise lacaniana, o sujeito é atravessado pela falta, uma marca estrutural que nos constitui. O desejo nasce justamente dessa incompletude. E, muitas vezes, quando idealizamos a figura do “melhor amigo”, estamos tentando tapar esse buraco, projetando no outro um lugar impossível: o de alguém que nos compreenderá totalmente, que estará sempre disponível, que será constante e incondicional, quase como um ideal materno ou um Outro absoluto.

Mas Lacan nos lembra que “não há Outro do Outro”. Não existe alguém que possa, de fato, nos completar. O desejo do outro não está ali apenas para nos satisfazer, ele também é dividido, também deseja, também falta. E quando o outro falha (porque falha mesmo), nos frustramos. Mas a frustração, nesse caso, não vem da relação em si, e sim daquilo que esperávamos dela: da idealização.

Essa idealização é construída muitas vezes a partir de referências culturais (como as amizades das séries ou dos filmes), mas também de nossas experiências infantis, desejos não simbolizados, e da esperança inconsciente de encontrar alguém que repare aquilo que ficou sem resposta.

Só que, paradoxalmente, é na quebra da idealização que o laço real pode se constituir. Quando deixamos de esperar que o outro nos salve, e passamos a escutá-lo e aceitá-lo em sua alteridade, com suas ausências, limites e falhas, abrimos espaço para uma amizade possível, concreta, viva.

E foi justamente nesse processo que percebi algo importante: eu vivo, sim, essas relações. Elas existem, são reais e eu posso contar com elas sempre que precisar, ainda que não se encaixem no roteiro perfeito das séries. São vínculos humanos, imperfeitos, mas verdadeiros. E talvez seja isso o mais valioso de tudo 🤗