O celular como objeto transicional: a Nomofobia em foco
A nomofobia, termo que vem do inglês no-mobile phobia, refere-se ao medo ou ansiedade intensa de ficar sem acesso ao celular ou a outros dispositivos móveis. Embora possa parecer um fenômeno moderno, ligado ao avanço da tecnologia e ao imediatismo da vida contemporânea, a psicanálise oferece uma lente interessante para compreendermos por que o sujeito se agarra tanto ao aparelho a ponto de se sentir “perdido” sem ele.
Do ponto de vista psicanalítico, o celular funciona muitas vezes como um objeto transicional — algo que dá ao sujeito uma sensação de segurança e presença, ocupando simbolicamente o lugar do outro. O aparelho torna-se mediador da relação com o mundo, sustentando vínculos, confirmando a existência do sujeito e oferecendo um alívio momentâneo para a angústia da solidão. A dependência não está apenas no aparelho em si, mas no que ele representa: a constante possibilidade de contato, de ser visto, ouvido, reconhecido.
Freud já nos lembrava que a angústia surge quando o sujeito se vê diante da possibilidade de perda. Estar sem o celular, para quem sofre de nomofobia, reativa fantasmas de abandono, de falta, de vazio — estruturas psíquicas muito mais antigas do que a própria tecnologia. Melanie Klein, ao tratar da relação entre presença e ausência do objeto, também nos ajuda a entender: a ausência de resposta imediata nas redes pode ser sentida como um ataque, uma rejeição ou uma ameaça à integridade psíquica. O aparelho, nesse sentido, se torna depositário de ansiedades primitivas ligadas à perda do objeto amado.
Lacan, por sua vez, amplia o debate ao trazer a ideia de que o sujeito é sempre marcado pela falta. O celular, então, aparece como uma promessa ilusória de completude — a sensação de que é possível estar sempre conectado, sempre em contato, nunca só. Mas essa é uma promessa enganosa: quanto mais o sujeito tenta preencher o vazio com notificações, curtidas e mensagens, mais se depara com a impossibilidade de satisfazer plenamente o desejo. A nomofobia seria, assim, a manifestação contemporânea da dificuldade de lidar com a falta estrutural que nos constitui.
Pensar a nomofobia a partir da psicanálise é lembrar que não se trata apenas de “vício em celular”, mas de um sintoma que revela muito sobre como o sujeito lida com a ausência, a solidão, a angústia e a relação com o outro. O aparelho é só o palco visível de um drama psíquico invisível: a dificuldade em suportar a falta e em elaborar a dependência emocional que temos, não do objeto em si, mas daquilo que ele simboliza em nossas relações e em nossa subjetividade.




